Páginas

5 de novembro de 2009

Por favor, fujam disso!

Tive o descontentamento de me deparar com um texto que, como vou explicar durante o post, fomenta o que hoje o ensino de administração transparece nas faculdades: sua baixa confiabilidade (seria zero?) de ser um curso científico.

O texto, cujo o título é "Pequenas igrejas, Grandes negócios: a fé e as performances profissionais", é do autor Flávio Alexandre Cavalcante, pelo que me parece, colunista do site Administradores.


Vamos lá então debater seu artigo. Ele pergunta, logo no inicio, "o quanto os fiéis de alguma crença adquirem vantagem competitiva em relação aos céticos, em se tratando do mundo dos negócios". Veja se isso é uma pergunta digna de quem estuda alguma ciência. Por acaso você escolhe um arquiteto para fazer um trabalho, motivado pela crença em que ele tem, ou por seu trabalho de arquitetura bem feito? Você vai escolher um engenheiro de uma fé fervorosa para construir sua casa, mas que não "entende tanto assim" de concreto armado, ou irá prefirir, ao invés, um bom calculista (e nem ligará se ele tem ou não alguma crença)?

Ele diz depois que "as religiões desenvolvem atributos que são bem vistos e relevantes ao mercado de trabalho, como por exemplo a disciplina de acatar ordens, muitas vezes de pessoas que você nunca viu" (???)
Ou seja, se a pessoa não tem religião ela será uma "desordeira-insubordinável" nas empresas na qual trabalhar? Meus amigos, isso é ridículo (ponto), as pessoas acatam ordens porque essa é forma de se trabalhar numa empresa, e na maioria das vezes será de pessoas que ela nunca viu (estou dizendo algum absurdo?).

Aí ele chega no ponto mais crítico do texto para mim: a fé. Antes devo esclarecer algumas coisas. Minha intenção aqui não é atacar religião, crença, fé ou dogma de ninguém, uma porque não é o objetivo do blog, outra que eu não tenho um mínimo de conhecimento argumentativo para ir contra ou a favor nesse assunto; minha intenção é explicar que Administração de Empresas é um curso superior, logo é ensinado como científico, e logo sabemos que científico é uma série de conhecimentos que façam alguma coisa no mundo real (pense no remédio pra dor de cabeça que você toma, é científico porque traz resultados: elimina a dor). Mediante isso, por que precisamos envolver assuntos não-científicos com Administração? Sempre é assim, por que não existe isso para um farmacêutico, ou um biomédico? Por que não tentam correlacionar a fé deles com a performance de seus trabalhos?

O autor alega que a fé trará benefícios para seus adeptos "acreditar de forma inabalável que tudo dará certo, mesmo que muitas vezes contra a lógica". Meus amigos, e com relação as várias pessoas que acreditam dessa forma, mas ao contrário, vê sua empresa falindo, seus negócios caindo, eles não acreditaram de forma suficiente? Qual o parâmetro desse acreditar que é necessário portanto? Acreditar de forma inabalável não resolve nada em situações difíceis de uma empresa (lembrem-se, estou sempre me referindo a empresas, negócios, administração, não inclua essas idéias em outros campos que não estou falando), e muito pior ir contra a lógica, qual o sentido de insistir em algo que foi logicamente diagnosticado que não terá sucesso? É essa o tipo de idéias que os administradores precisam ter? De serem irracionais, porém muito perseverantes?
E para fechar (para dar um ar "científico" no artigo), ele sugere uma opção de estudos posteriores: "analisar as atividades de empresas no último trimestre correlacionando com as religiões de seus proprietários". Preciso falar mais alguma? O texto é muito prejudicial do começo ao fim, qual correlação que ele quer encontrar nisso? Ele acha que então os administradores necessariamente precisão de uma religião para exercer seu trabalho de forma eficaz? Que absurdo! Onde você, caro leitor, encontra isso em disciplinas seriamente estudadas? Não existe, isso deve acabar, pelo bem do ensino do ADMINISTRAÇÃO, fico aqui o meu protesto CONTRA esse artigo.

***

Pessoal, um post não dá para explicar muitas coisas, então várias questões eu poderia ter abordado com a chance do texto ficar muito grande e cansativo. Por esse motivo, alguns atributos que o artigo em debate apresenta, como "ser perseverante" eu não discordo, e quem discorda? Perseverança é um atributo louvável para todos, mas erguê-la ao ponto ser a causa do sucesso de alguma coisa é besteira e auto-ajuda, ou seja, sem relevância científica alguma para os administradores.

2 comentários:

  1. Olá Carlos!
    Parabéns pelas suas críticas ao artigo do Flávio Cavalcanti, colunista do Administradores. Como editor do site, fico extremamente satisfeito quando os temas geram discussões, polêmicas e estimulam outras pessoas inteligentes como você a se posicionarem - seja contra ou a favor do que quer que tenha sido publicado em nosso veículo.
    Em face da revolta de vários leitores diante do referido artigo, comentei que a opinião de nossos articulistas não necessariamente é a do portal ou de seus coordenadores. Tenho certeza que é aí que reside a riqueza desse canal. Ao mesmo tempo que temos o Stephen Kanitz fazendo elogios ao governo Lula, temos o Rodolfo Araújo baixando o sarrafo no Bolsa-Família.
    Por fim, pretendemos ser sempre essa arena onde as ideias fluem livremente, onde se possa discutir de forma sadia e civilizada. Dessa forma, convido você a criar um perfil no site para postar lá a sua crítica ao artigo do Flávio!
    Um grande abraço,
    Leandro Vieira
    www.administradores.com.br

    ResponderEliminar
  2. Carlos, eu também já havia comentado esse texto lá no Administradores.

    O fato de haver correlação não significa que exista, necessariamente, relação de causa/efeito, como o autor diz no texto. São duas coisas bem distintas.

    Abraço, Rodolfo.

    ResponderEliminar